14/03/2010

Crônicas possíveis

Há algum tempo eles não se encontravam. Dias ou semanas, talvez. E por um descuido do destino, aquela tarde reservou a mesma calçada a um antigo casal que não caminhava mais de mãos dadas.
As mulheres se sentem a vontade com seus antigos namorados. Já os homens... Bem, os homens, nem tanto.
Não aquele homem e não depois de vê-la sorrir, contradizendo toda a sua expectativa de que atravessasse a rua.
- Você está ótima! - disse ele,  quase que como não fosse possível. Faziam poucas semanas desde que ele decidiu ir embora e levou metade dos planos dela junto.
Mas ela estava realmente ótima. Vestia cores claras, e tinha algo no cabelo... algo que estava diferente, ele não saberia dizer com certeza o que era, mas ela estava ótima!
- Obrigada!
Não, ela não disse o mesmo! Claro, poderia dizer apenas pela conveniência ou não dizer apenas pelo prazer da vingança, mas ela não disse, simplesmente porque não importava. Ele deveria estar se sentindo muito bem, afinal, fez o que queria.
Incrível, como assuntos banais tornam-se grotescos quando a intimidade afasta as pessoas. O tempo, a notícia na televisão, a visita daquela tia que ambos faziam piadas. Hoje não teve graça. Nenhuma, na verdade.
Porque ela perguntou do meu trabalho? - ele pensou - ela já deve ter alguém em um cargo mais importante para acordá-la com o café.
Quantas vezes deixou que a preguiça o impedisse de servir o café na cama. Arrependeu-se por alguns instantes. Aquela mulher a sua frente merecia ser acordada todos os dias, e provavelmente, estaria sendo.
Ela tinha um novo emprego. Melhor que o antigo. Aparentemente estava satisfeita.
As mulheres sempre se dedicam ao trabalho para tentar esquecer um desamor. Nisso elas realmente sempre foram mais determinadas, mesmo que após longas jornadas, deitassem em suas camas e não desejassem nada mais que um abraço.
Conversaram. Conversaram e conversaram. Não mais que por dois ou três minutos. E quando ela se sentiu inconveniente, lembrando-se que aquele homem não desejava mais a sua presença, inventou uma desculpa qualquer para partir.
Ah sim! Como gostaria que a convidasse para um café. Essa fantasia impediu que ela ouvisse a resposta para sua partida. Seria mesmo muito agradável um café...
- Pode deixar que eu mando sim – respondeu automaticamente a provável falsa preocupação dele com um de seus entes qualquer.
Com um beijo no rosto se despediram. Ele demorou a soltá-la do, quase, abraço que deram. E quando ela já se preparava para atravessar a rua, ele tomou seu braço e olhou em seus olhos.
Aqueles instantes mágicos que fazem nossas vidas reais parecerem filmes, sabem?
Não conteve as palavras. Não sabia ao certo nem de onde haviam saído. Acabaram com o seu orgulho masculino de controlador dos próprios sentimentos. Foram irracionais, dando espaço ao homem por quem aquela mulher se apaixonou...
- Como você pode estar tão bem?
Ela sorriu novamente. Sentiu a preocupação do homem amado. E antes mesmo que ele pudesse soltar a sua mão deixou que as palavras, muitas vezes ensaiadas saíssem na ordem errada:
- Eu não menti quando disse que me importava tanto com a sua felicidade que preferia que partisse, ao deixar de me amar. Prefiro sofrer por não tê-lo, do que nunca tê-lo amado!
Ela se foi. Com um caminhar leve. Com os cabelos intrigantes. Deixando apenas o perfume.
Como ele quis convidá-la para um café... uma pena ela já ter outro compromisso.

2 comentários:

Alexandre Gaioto disse...

Bacana, Bacana! Vamos em frente, Tatha Fernandes! Não pare: o time de contistas maringaenses tá interessante! E adicionei seu link lá no blogue. Abraços!

Paulo disse...

Tá, sou seu fã, eu sei que num vale.. mas adorei, cheguei a imaginar a cena!!